Seus
pés estão cansados a uma barreira entre você e o mundo real, seus olhos fitam
com amargura o nada, com o inquietante desespero assistindo pequeninos sonhos
serem levados por um mar calmo e sem ondas, ao mesmo tempo misterioso e
infinito. Talvez fosse mais fácil se as decisões dependessem somente do autor
dessa história, eu te preencheria de conselhos com a banal esperança de que
faria alguma diferença, mas do que adianta ter fantasias fundamentadas só em
palavras? Nossos desejos e crenças ficam frágeis diante das limitações e assim
se segue a vida, delicada e rude. Eu me responsabilizo pelos seus atos apesar
de achá-los tão estúpidos, e as suas tentativas de chorar, todas em vão, rasga
o meu peito. Os sentimentos que lhe envolve, petrificados pelo orgulho calado
que cresceu em ti sem perceber, roubam os versos. E o meu coração acelerado
pediu um cigarro, e deixo seu silêncio gritar em mim.
.
quarta-feira, 26 de dezembro de 2012
quinta-feira, 29 de novembro de 2012
A cidade dos desfavorecidos.
Eles vinham marchando em
bando rumo à cidade grande. Fortes homens quase nus, com a exceção dos pequenos
trajes cobertos por penas coloridas. Bem preparados, armados com fé e coragem. Chegavam
cantando em coro dispostos a enfrentar o seu pior inimigo, o monstro branco da
metrópole. Organizados, belos e em simetria assustavam a civilização que
finalmente depois de onze meses praticando o mesmo exercício durante dez horas
ao dia conseguiriam sair da rotina. O showmício estava a dois quarteirões, e
unidos seguiram em frente. O primeiro alvo, foi o senador R.B., o mesmo que
estava na linha de frente a favor das industrias elétricas, com uma flecha atravessada caiu de olhos
abertos no chão, o bote já tinha sido organizado, e as flechas voavam por todo
o centro da cidade, deputados e vereadores sangrando como vaca no abatedouro,
naquela tarde a policia federal continuava a sua greve por um salário mais
justo que os seus doze mil reais mensais e a civil estava muito ocupada com
algum tipo de corrupção que os próprios cadáveres tinham permitido acontecer. O
cacique D. dominou o palanque e começou a se manifestar, “Os brancos escrevem
sobre amor em seus livros, em seus muros, e em seus equipamentos modernos, mas
esquecem de praticá-lo. Falam sobre sustentabilidade, mas compram o que não
precisam consumir. Mandam seus filhos as escolas para que possam estudar sobre
os índios, mas o que dirão a eles quando perguntarem porque estamos em
extinção?”, as palavras iam e vinham e depois de algum tempo o governo havia
sido tomado pelos índios. Prédios comercias foram demolidos, e arvores
cresceram no lugar, os veículos se tornaram desnecessários. Para evitar à crise
as pessoas começaram a cultivar os seus próprios alimentos a costurar suas
próprias vestimentas. Eu te contando você não acredita. A ambição das pessoas havia
desaparecido, parece que colocaram uma espécie de união no lugar. O último
discurso do cacique D. dizia ter sido uma pena tomar de volta a terra deles com
sangue, mas que não aguentava mais perder os seus meninos pra fome e suas
meninas pra prostituição. Ouvi falar que vão dominar por aqui em breve, que
assim seja, por que eu não aguento mais ver as pessoas morrerem por causa de
papel.
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
O arrependimento de Dona Benedita.
Talvez em minha passagem eu tenha sido mais um
numero na sociedade, que com os seus papéis nos tornam vivos ou mortos, mas que
molham e queimam. Talvez mais um instrumento de ossos e carne que sangra e no
final se desintegra como tudo que é vivo e segue em passos errantes. Talvez em
minha transição eu tenha enfeitiçado alguns rapazes, motivado inveja ou eu
mesma sentido cobiça, a rotina é cheia dessas infantilidades, mas tudo se
ausenta, assim como as nuvens que trazem chuva. Talvez tenha sonhado com outras
vidas, porque nunca conseguimos imaginar a dimensão que o destino é, onde ele
nos leva, é sempre assim, pra todos, sem exceção. Sonhamos histórias, vivemos
histórias e sem perceber começamos a contar as nossas próprias experiências. A
vida inteira observando o tempo passar, e quando fico de frente ao espelho
percebo que o tempo de mansinho sempre me trapaceou, fecho os olhos por um
momento e lá vai ele me levando alguns anos, tão preciosos, e não há nada que
os traga de volta, sem feitiço ou poço da juventude, viver é bem mais
interessante que um conto de fadas, e também é assim pra todo mundo, sem
exceção, todas as histórias podem ser atraentes.
Parada no ponto de ônibus, afastando um pouco
mais as horas da minha juventude um velho sábio me disse: Se a minha vida lhe
parece mais simpática, é porque a sua história, minha pequena, não soube
contar.
Lembrando-me desta frase, mudei as minhas
percepções, mas já é tarde demais, como tudo que queremos na vida e deixamos
pra depois. Queremos viver outras épocas, ter conhecido outras pessoas, outros
lugares, e esquecemos de desembrulhar o presente que é o presente. Não virei
conselheira por estar velha, só estou de passagem mesmo, só quero lhe dizer,
que foi uma pena não ter te conhecido pessoalmente, pois, se tem algo que aprendi
em todos esses anos bem e mal vividos é que qualquer afinidade tem um poder
infinito.
Ah, e se eu tivesse apenas um conselho para lhe
dar seria: esqueça todos os conselhos e viva sua vida. Ela é mais intensa que
palavras. Mas de qualquer forma, é tudo caretice.
quinta-feira, 23 de agosto de 2012
Ciclo fiel.
Exausto ele estava de levantar as suas
mãos para os céus e pedir perdão pelo que o seu corpo não sentia, somente
desejava. As crianças que corriam pelo saguão, principalmente os meninos, os
provocavam em sua inocência. Todo o antepassado de sua história o acalmava e
trazia coragem como se possuí-los fosse uma maneira certa de honrar os tecidos
negros de suas batinas. Sua vontade estava tão clara quanto à hóstia que
empurrava goela abaixo na garganta dos fieis com a promessa de um mundo sem
vaidade e ambição, logo em seguida ansiava pelo dizimo. Naquele universo
paralelo distante dos pecados mundanos ele era o dono da razão, o argumento que
não podia ser retrucado, para os mais fracos a voz de Deus usando a sua boca
para trazer harmonia para os necessitados. Então veio a sedução, o primeiro
passo, tão fácil como trair cristo por 30 moedas, a noite tinha que cair, o
silêncio tinha que estar presente para que a primeira alma pura recebesse sua
benção, assim ele havia tratado. Não demorou. Todos os dias as horas são
iguais. A porta do começo dos seus segredos se abriu, algumas palavras foram
ditas, algo foi posto para beber e os sussurros começaram. Ali se estreou uma
infindável rotina de prazer, o lacrimejar e o sangue escorrendo pelas pernas
miúdas acrescentavam ainda mais encanto a sua loucura sã. A igreja sabia o que
os devotos nunca desconfiaram e assim, os anos se passaram até a sua velhice
chegar, não veio o arrependimento. Era mais fácil o seu Deus perdoar um pecador
que orava do que um santo pobre ateu.
E eu me tornei reflexo do que a
infância me ensinou, e não seja tolo ao pensar que é algum tipo de vingança, os
caminhos que me instruiu, pedra por pedra é uma obra divina. Aguardo o badalar
do sino, esqueço o passado, faço o sinal da cruz e levo paz aos que imploram
piedade.
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
Leito
Pela
manhã com o relógio desperto
Inquieto
Abro
os olhos, contrariado
E
cansado
Os
dedos fracos ainda dormem
Escuto
os carros
Que
se afastam
Ou
param
Como
hei de saber?
O
dia claro
E
raro
Com
mistérios sem fim
Pertence
a mim
O
viver
Tarde
pra quem chega
Enche-se
de preguiça quem fica
E
aos que vão
Bem
vindo às incertezas
Bom
dia.
quarta-feira, 1 de agosto de 2012
Encruzilhada. (O Início de uma história)
A
noite quente caia doce sobre os seus olhos castanhos escuros, e as vidas
passavam em nossa frente a toda velocidade, vidas cobertas de pratas e pretos,
vermelhos e amarelos. Sua mão quente aquecia minha pele e seu cabelo negro me
desconcertava. Uma encruzilhada de faróis e as baias das calças molhadas pela
chuva que acabara de passar. Já era tarde da noite e a história não esperava
por ninguém, foi quando sua voz navegou sozinha no som do silêncio, e eu me
apeguei a isso. Juro que me apeguei. Minha percepção já tinha ido embora junto
com as palavras. O que teria sido se não tivesse parado naquela encruzilhada
para apreciar a experiência? Ela foi o meu ponto de fuga naquele crepúsculo
abafado, diferente de parar em frente á televisão e assistir a um velho
programa de conveniência, algo que completou a minha essência. Naquele momento
eu conquistei o infinito, que em minha inocência era apenas uma maneira de escapar.
sexta-feira, 27 de julho de 2012
Um corpo, mil almas.
Ele
vinha cambaleando com seus passos desleais pelas ruas estreitas, vivendo com o
tempo e a carne emprestada sem saber por quem e nem a quem devolver. Com suas
milhares de almas adaptadas ao momento, trabalho, jogo, parques, bares. Ele era
um só, mas nunca o mesmo. Desceu sem qualquer precisão a ladeira do ouro,
arrostou alguma pessoa igual a ele em morte, mas na existência com mais
arrogância e dinheiro. Tanto faz, já trazia consigo o conceito de que todos em
algum momento iria se apegar a futilidade e era necessário moldar-se conforme a
multidão. Sentia-se velho pras afrontas que um dia acreditou. Difícil de
identificar que era o mesmo imaturo, pra idade, diga-se de passagem, mas, porém
com mais fé e coragem, que pelos tropeços do seu caminhar esqueceu em algum
prostíbulo junto com os seus ideais. As responsabilidades rotineiras tomaram
conta dos seus sonhos. E com a desordem do seu interior, cansado de cambalear,
estira-se no chão, não só com o corpo e permite os seus fantasmas se igualarem
a contemplação que é a natureza. No ponto alto de seus delírios descobre que
atrás da cortina de fumaça que o tempo e as pessoas criaram permanece ali intacta
e nunca deixará de existir a constelação.
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